quarta-feira, setembro 23, 2009

ESCRITOR DA SEGUNDA MORTE DE LAMPIÃO DIZ QUE ESTÁ SENDO AMEAÇADO DE MORTE


Entrevista a Reginauro Silva e Yago Cavalcante – Fotos Bel Montalvão
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Nos últimos 17 anos, o fotógrafo José Geraldo Aguiar, 59 anos, de São Francisco, tem se afastado parcialmente de seu estúdio e se dedicado à coleta de dados e documentos que comprovassem sua tese histórica: a de que o legendário Lampião, não teria sido assassinado em emboscada promovida pelas forças policiais em 28 de julho de 1938, na localidade de Angico, município de Poço Redondo, no estado de Sergipe. Segundo o fotógrafo-pesquisador, o esquartejamento de Lampião e outros jagunços não passava de uma farsa, pois o verdadeiro cangaceiro teria desistido do ofício antes da emboscada, deixando de ser Virgulino Ferreira da Silva para, juntamente com Maria Bonita e outros seguidores, fugir para a cidade de Paulo Afonso e, de lá, para o Norte de Minas, num roteiro que inclui Manga, Itacarambi, Missões, povoados de Brejo do Amparo, São Joaquim e Tijuco, em Januária, Pedras de Maria da Cruz, Matias Cardoso, Burarama, hoje Capitão Enéas, Arinos, Urucuia, São Francisco e finalmente Buritis, onde faleceu em 1993.

Após reunir as provas, Geraldo revelou-as em seu livro Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes, que está sendo lançado em várias cidades do Nordeste, em Brasília-DF e em Montes Claros.

Por meio dessa revelação bombástica e fundamentada em provas, Geraldo Aguiar poderá remodelar significativamente a história oficial brasileira do período da República Velha. Além de já ter recebido, até mesmo, um convite para produzir um filme a respeito do assunto.

Em São Francisco, ele concedeu, com exclusividade, a seguinte entrevista:

- Sem dúvida, Lampião é um dos mais importantes personagens na composição da história do Brasil. De acordo com a versão defendida pelo senhor, em que pontos a história oficial se faz fiel à realidade ou se distancia dela?

- Lampião foi o mais importante cangaceiro brasileiro e, diante de acirradas perseguições a ele no Nordeste, o cangaceiro planejou fugir desapercebidamente daquela região, e assim o fez. O tenente Bezerra, que se diz matador de Lampião, já era conhecido na região sertaneja como um oficial corrupto, pois mantinha uma relação amistosa com o cangaceiro, chegando até mesmo a jogar cartas nas horas vagas. Além disso, é sabido também que Bezerra fornecia armas e munições a Lampião. Logo, isso já sugere uma grande incógnita – ele teria mesmo matado o rei do cangaço?

- Se lampião não foi morto em emboscada em 1938, no sertão de Sergipe, outro grupo de cangaceiros teria sido confundido com o de Lampião ou tudo não passou de uma farsa dos policiais para se verem livres da missão que lhes foi proposta?

- Houve a emboscada, no entanto, não se sabe quem de fato estava nela. Conforme Lampião já havia planejado, ele se ausentou desse ocorrido e fugiu antes dele.

- Há quem defenda que, durante a suposta emboscada, um dos “macacos”, como Lampião gostava de se referir aos policiais, teria lhe desferido uma coronhada de fuzil no rosto, o que lhe causou desfiguração facial, contribuindo para a ideia de que ele não fora morto. Como o senhor interpreta essa versão?

- Como se sabe, a história de Lampião é repleta de versões e esta existe, mas sem qualquer confirmação baseada em provas. Mantive contato, certo tempo, com o ex-cangaceiro Sebastião Santos Vieira, que menciono no livro, e ele, aos 86 anos, me afirmou ter presenciado a emboscada de 1938, chamando de “cabra mentiroso” quem diz ter matado Lampião. Ele confessa ainda ter sido preso naquele dia e que o rei do cangaço não se encontrava ali.

- O senhor garante que, após deixar o Nordeste, Lampião teria fugido para o Norte de Minas. Em que cidade ele passou a residir?

- Ao sair de Angico, Lampião procurou um porto seguro no Piauí, o único estado que ele nunca havia atacado. Lá, ele viveu por alguns anos, depois passou a residir na Bahia e, gradativamente, veio descendo pelas bordas do Rio São Francisco, até chegar em Minas Gerais. Aqui, ele esteve em inúmeras cidades, sendo Manga a primeira delas, onde teve seu filho primogênito.

- Como sabemos, Lampião não vivia sozinho. Qual foi o paradeiro dos outros membros do cangaço, inclusive o de Maria Bonita?

- Apesar de o cangaceiro Criança ter sido encontrado depois de muito tempo na cidade de Santos, no litoral paulista, a maioria deles se dirigiu para Minas Gerais. O cangaceiro Sabino, por exemplo, residiu em Bocaiuva. Moreno e Durvinha, ex-colegas de Lampião, residem em Belo Horizonte; Durvinha, infelizmente, já faleceu, mas Moreno ainda continua a manter um boa amizade comigo. Já Maria Bonita morreu em 1978, em Montes Claros, no hospital São Lucas, acometida por um câncer e está enterrada hoje na fazenda Contendas, próximo daqui.

- O senhor assegura que se encontrou com Lampião várias vezes em São Francisco. Como era Lampião?

- Lampião era um homem sério, alto, forte, tinha o olho direito problemático, falava pouco, nunca sorria e só respondia o necessário. Enfim, era um homem de poucas palavras.

- E Maria Bonita fazia jus ao nome?

- Com certeza. Ela era uma morena bem feita de corpo e de cabelos longos, apesar de já estar com seus 77 anos. Repetindo, cheguei a tirar uma foto dela, que se encontra no livro.

- Por que o senhor ão anunciou a sobrevivência do cangaceiro já naquela época?

- Eu já estava, há algum tempo, à procura de Lampião e, casualmente, eu o encontrei. Ele me pediu que mantivesse nossa relação em segredo. E eu, após captar tantas informações surpreendentes, estava certo de que elas já seriam suficientes para publicar um livro. Certo dia, disse a ele que queria filmá-lo e escrever sua história; mas ele me respondeu em alto e bom som: “Meu passado é muito problemático, não posso aparecer!”. É engraçado que todos os dias em que eu o visitava, ele me dizia: “Volte amanhã, cabra”. A partir do momento em que eu quis filmá-lo, nunca mais ele me pronunciou essa frese. No dia seguinte, quando retornei à sua casa, ele já havia ido embora para Buritis, onde faleceu.

- Você acredita que Lampião pudesse sofrer alguma punição mesmo após ter abandonado o cangaço há tanto tempo?

- Conforme a legislação brasileira, ele não tinha mais nada a pagar, já que os crimes prescrevem com 20 anos e ele já havia abandonado o cangaço há 54 anos.

- Que provas confirmam a presença do rei do cangaço no Norte de Minas nessa época?

- As provas são inúmeras, como fotos, documentos e fatos, e estão todas reveladas no livro. Um tenente daqui da região, que ainda está vivo, me enviou um recado solicitando que eu o procurasse. Assim o fiz. Ao encontrá-lo, ele me encorajou a continuar as pesquisas. Segundo ele, em 1961, constantes brigas ocorriam do outro lado do Rio São Francisco, nas quais sempre estava envolvido um homem que costumava agredir as pessoas por motivos quaisquer. Diante disso, alguém veio denunciá-lo na cidade. Daí, o delegado enviou uma intimação ao acusado que, friamente, amassou o documento e o jogou fora. Dias depois, o mesmo senhor que havia desconsiderado a intimação passava em frente à delegacia quando um dos soldados o reconheceu e lhe pediu que fosse conversar com o delegado. No diálogo, bastante tenso, o referido senhor chegou a dizer, batendo fortemente na mesa, que o delegado não era homem o suficiente para prendê-lo. Após relatar-me esse fato, o tenente me assegurou que não restava dúvida de que aquele homem era, na verdade, Lampião. Virgulino também vivia a trocar de nomes, chegando a adotar 13, dos quais 5 estão expostos no livro.

Outra incoerência da história oficial é o fato de a perícia da cabeça de Lampião ter sido feita pelo dentista Dr. José Lages Filho, em cujo laudo ele jamais afirma que aquele membro era de Virgulino; até mesmo porque o profissional não o conhecia.

Além dessas provas, há fotos inéditas que eu mesmo tirei de Lampião e de Maria Bonita no meu estúdio, em 1978 e que estão no livro. Inclusive, elas foram enviadas para o IML (Instituto Médico Legal) de Brasília-DF que, após examiná-las, classificou-as como fieis à pessoa de Lampião.

- A fim de dar maior veracidade às suas provas, o senhor tem solicitado, perante à justiça, a exumação do corpo de Lampião. Onde ele estaria enterrado hoje?

- Lampião está enterrado no cemitério da cidade de Buritis, no Noroeste de Minas.

- O senhor obteve sucesso nesse pedido de exumação do cadáver?

- Em 1996, eu entrei sim com um pedido de exumação, que foi indeferido. O indeferimento decorreu da petição errônea formulada pelo advogado, recém-formado, que eu havia contratado. Depois disso, preparei-me melhor para um novo pedido, munido de documentações e de procurações tanto de sua última esposa, quanto de alguns de seus filhos. Mas, como os outros familiares desaprovam a exumação, eu desisti dela. Para se ter ideia, estou sendo ameaçado de morte. Recebi um recado de que, caso eu lançasse o livro, alguém me mataria aqui em São Francisco. Inclusive, nunca disse nada a ninguém a respeito dessa ameaça, estou revelando de forma inédita a vocês. Diante dessa situação, decidi abrir mão da exumação, até mesmo porque ela não é imprescindível.

- Qual o caráter preponderante de seu livro?

- O livro Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes! tem caráter eminentemente investigativo. Já há 2.000 exemplares impressos. Nos próximos dias, haverá o lançamento em Crato, em Fortaleza-CE e Juazeiro do Norte, no Ceará, e em Brasília-DF. Certamente também haverá o lançamento em Montes Claros, dia 19 de novembro deste ano.

- Finalizado todo o processo de lançamento da obra, o senhor pensa em solicitar a reformulação da história oficial do cangaço perante os órgãos históricos competentes?

- Com certeza.

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